O que é detração de pena?

Detalhando este direito fundamental do condenado
Home / Criminal / O que é detração de pena?
Compartilhar este conteúdo

Por Juliano Mello.

 

Quando uma pessoa é condenada a uma pena privativa de liberdade ou a uma medida de segurança, o tempo que ela passou presa provisoriamente (no Brasil ou fora), o tempo que passou em prisão administrativa e o tempo que passou internada em hospital de custódia ou similar devem ser contados como pena cumprida.

Isso é a detração, a qual está prevista no artigo 42 do Código Penal (CP).

Frise-se: o tempo detraído é contado como pena cumprida; ou seja, não se trata de redução da pena imposta.

Por exemplo: se alguém, durante o processo, ficou preso provisoriamente por um ano e, ao fim e ao cabo, foi condenado a seis anos de reclusão, cumprirá apenas mais cinco anos. A pena não fora reduzida. Continua em seis anos. Mas restam apenas cinco a cumprir.

Trata-se de direito subjetivo do preso, que deve ser reconhecido e garantido.

 

Quem decide sobre a detração

 

O artigo 66, inciso III, alínea c da Lei de Execução Penal (LEP), diz que compete ao juiz da execução decidir sobre detração da pena.

Isso significa, primeiramente, que a detração é uma atividade jurisdicional, e não administrativa. Portanto, não pode o diretor do presídio, por exemplo, concedê-la ou negá-la.

Também, significa que não cabe ao juiz do caso em primeiro grau (em regra) e nem a um tribunal superior, ao julgar apelação, recurso especial etc aplicar a detração. Normalmente, será preciso o trânsito em julgado da sentença e a instauração do processo de execução, para que o juiz competente decida a respeito.

Neste sentido, o Superior Tribunal de Justiça (STJ):

“Nenhum reparo merece o acórdão proferido pelo egrégio TJMG, que, com acerto, determinou o cumprimento da pena de prestação de serviços à comunidade, pelo prazo de 3 mesees – tal como fixado na sentença condenatória -, competindo ao Juízo da Execução Penal eventual detração, relativamente ao período relativo à prisão preventiva.” (HC 90.285-MG, 5ª Turma, rel. Napoleão Nunes Maia Filho, 11.12.2008, v.u.)

A exceção está no artigo 387, parágrafo 2º do CP, onde é imposto ao juiz de primeiro grau realizar a detração para fins de fixação do regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade.

Esta determinação entrou em vigor com a Lei 12.736/2012, e de maneira muito bem-vinda, porquanto otimiza a prestação jurisdicional.

 

Detraindo tempo de prisão de outro processo

 

Esta discussão suscita polêmica.

A corrente que predomina hoje é a de que sim, é possível a detração utilizando-se de tempo de prisão referente a outro processo, SE o crime que receberá a detração for anterior à prisão feita.

O STJ já decidiu nesta toada:

EXECUÇÃO PENAL. HABEAS CORPUS. DETRAÇÃO. INCIDÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE. MESMO PERÍODO DE PRISÃO CAUTELAR JÁ UTILIZADO COMO DETRAÇÃO DA PENA DE UMA EXECUÇÃO SER UTILIZADO PARA APLICAR A DETRAÇÃO EM OUTRA EXECUÇÃO EM CURSO. IMPOSSIBILIDADE. BIS IN IDEM FLAGRANTE. ILEGALIDADE. ORDEM DENEGADA. 1. É admitida a detração em relação a fato diverso daquele que deu azo à prisão processual; contudo, somente em relação a delitos anteriores à segregação provisória, sob risco de se criar uma espécie de crédito contra a Justiça Criminal. Precedentes. 2. No caso dos autos, apesar de a segregação cautelar ter ocorrido em período posterior ao fato em que requer a sua consideração, o tempo pelo qual o paciente permaneceu preso preventivamente foi utilizado para extinguir a punibilidade em relação ao crime previsto no art. 28 da Lei nº 11.343/06, de modo que esse mesmo período não pode ser utilizado para a detração de outra execução em curso, sob pena de bis in idem. 3. Habeas corpus denegado. (HC nº 422.310/DF, rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6ª Turma, j. em 19/04/2018, DJe 11/05/2018)

 

Detração e prescrição

 

A detração também pode levar à prescrição da pretensão executória, em benefício do apenado.

O raciocínio também é estritamente matemático: pega-se a pena-base; daí, aplica-se a detração que couber; obtém-se um restante, que é o que falta ser cumprido; se por alguma razão o início de cumprimento da pena fora protelado, consulta-se o artigo 109 do CP, a respeito dos prazos prescricionais; se, a este restante, corresponder um prazo prescricional que já venceu, o apenado estará livre.

Foi assim que resolveu o Supremo Tribunal Federal (STF):

PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA VERSUS PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA – DETRAÇÃO. A detração apenas é considerada para efeito da prescrição da pretensão executória, não se estendendo aos cálculos relativos à prescrição da pretensão punitiva. (HC 100001, Relator (a): MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em 11/05/2010, DJe-110 DIVULG 17-06-2010 PUBLIC 18-06-2010 EMENT VOL-02406-03 PP-00571)

 

Conclusão

 

Fica claro, então, que a detração é um direito importantíssimo do apenado na Execução, que deve ser defendido ferrenhamente pelo advogado.

Muitas vezes ela é passada por alto, não por mal, mas por falha humana de serventuários da justiça somada à desatenção de defensores.

Não é justo, conforme a Constituição Federal de 1988, que o condenado fique preso por tempo além do fixado na sentença (artigo 5º, inciso LXXV), sendo a detração uma forma equilibrada de fazer cumprir este direito fundamental.

 

Referência bibliográfica: NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. – 16. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2016.

 

Juliano de Henrique Mello é advogado nas áreas Criminal e Cível.

×