Via Alexandre Zamboni.
Poucos ainda não assistiram a este vídeo, dada a enorme repercussão, mas, de todo modo, segue:
Segundo notícias (G1), o delegado, da Polícia Civil, arrombou a porta do imóvel para prender uma mulher que teria descumprido uma medida protetiva contra o enteado dele, 13 anos. O equipamento flagrou também o momento em que ele, bastante agressivo, diz, mais de uma vez, que “vai estourar a cabeça dela”.
Ainda, segundo as notícias, o delegado trabalha no município de Sorriso, a 420 km de Cuiabá, e está em estado probatório. Ele foi aprovado no último concurso da Polícia Civil.
Sobre o caso, alguns esclarecimentos jurídicos:
Primeiramente, saibamos que a Constituição Federal afirma que a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar, EXCETO em casos de prestação de socorro, desastre, flagrante delito ou cumprimento de ordem judicial (neste caso, durante o dia).
Ou seja:
Somente pode haver ingresso dentro da casa de alguém, sem este alguém permitir, nas seguintes situações:
- Para prestar socorro (em qualquer horário)
- Em caso de desastre (em qualquer horário)
- Para prender em flagrante delito (em qualquer horário)
- Para cumprir ordem judicial (desde que durante o dia)
Não era caso de prestar socorro, nem de desastre e nem havia ordem judicial de violação domiciliar ou de prisão.
Segundo o advogado do delegado, este (o delegado) invadiu a residência para fins de efetuar prisão em flagrante (fonte: G1).
Segundo o advogado da mulher, a ação ocorreu depois das 20h e não poderia ser realizada neste horário (fonte: G1).
Em caso de FLAGRANTE, como já expus neste texto, não se aplica restrição de horário, daí porque este argumento de ter sido o ato depois das 20h não tem serventia.
O que há de se questionar é se HAVIA ou NÃO HAVIA situação de FLAGRANTE.
Por tudo que li e ouvi, tudo indica que não havia, sequer era caso de crime permanente (que admite prisão em flagrante independentemente de quanto após o início da conduta).
Se realmente eu estiver certo (no sentido de que não havia situação de flagrante delito), temos em tese, dois crimes de abuso de autoridade cometidos pelo delegado:
- Art. 9º, caput, da Lei 13.869/19, que afirma ser crime a conduta de decretar medida de privação da liberdade em manifesta desconformidade coma s hipóteses legais (pena: detenção, de 1 a 4 anos, e multa).
- Art. 22, caput, da Lei 13.869/19, que afirma ser crime a conduta de invadir ou adentrar, clandestina ou astuciosamente, ou à revelia da vontade do ocupante, imóvel alheio ou suas dependências, ou nele permanecer nas mesmas condições, sem determinação judicial ou fora das condições estabelecidas em lei (pena: detenção, de 1 a 4 anos, e multa).
Fora da Lei de Abuso de Autoridade, ainda teríamos crime de ameaça (art. 147 do Código Penal).
Em caso de existência do estado de flagrante delito (o que desconheço até o momento por tudo que li e ouvi), tais crimes mencionados acima não poderiam ser imputados ao delegado, o que não significa dizer que este não possa vir a ser responsabilizado por excessos cometidos durante a diligência, inclusive quanto ao já mencionado crime de ameaça.
Para além de apuração criminal, haverá apuração administrativa, inclusive a Corregedoria da Polícia Civil do MT afirmou que já instaurou procedimento.