Apresentação antecipada de cheque, por si só, não configura dano moral

A jurisprudência foi sendo alterada nos últimos anos
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O Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao longo dos anos, deparou-se com inúmeras ações em que pessoas se insurgiam contra seus credores, os quais descontavam seus cheques pré-datados antes da data combinada.

Tais credores o faziam valendo-se da Lei 7.357/1985 (Lei do Cheque), artigo 32, que diz que “o cheque é pagável à vista”, bem como o parágrafo único, que diz que “o cheque apresentado para pagamento antes do dia indicado como data de emissão é pagável no dia da apresentação”.

Foi o caso dos Recursos Especiais (REsp) 16.855-SP, julgado em 1993, 213.940-RJ, julgado em 2000, 557.505-MG, julgado em 2004, 707.272-PB, julgado em 2005 e 921.398-MS, julgado em 2007.

O tribunal, então, viu a necessidade de editar uma súmula, a de número 370, de 16 de fevereiro de 2009, em que enunciou o entendimento de que a apresentação antecipada de cheque pré-datado caracteriza dano moral.

Contextualizando a situação, 2009 foi um ano em que ainda vigorava no Brasil um cultura jurídica que reconhecia dano moral em várias situações de descumprimento contratual.

Recordo-me de casos em que uma pessoa quitara o financiamento do carro através de várias indenizações por dano moral recebidas em ações dos Juizados Especiais Cíveis (JEC), uma hora porque a geladeira comprada teve a entrega atrasada, outra hora porque um estorno de compra feita por cartão de crédito não fora realizado muito rapidamente etc.

Entretanto, tal entendimento foi sendo superado, porquanto a iniciativa privada, em especial os pequenos comerciantes, considerados os verdadeiros motores econômicos do país, foram sendo prejudicados ao ponto de terem seus negócios correndo o risco de serem inviabilizados.

A jurisprudência do mesmo STJ foi avançando no sentido de reforçar que “o mero descumprimento contratual não gera dano moral indenizável”.

O entendimento foi sendo seguido pelos tribunais nacionais, a exemplo do tribunal paulista, cujo Conselho Supervisor do Sistema de Juizados Especiais editou o enunciado 48 neste sentido.

Expressões como “mero dissabor cotidiano” e “mero aborrecimento” tornaram-se bastante conhecidas do público em geral, por serem utilizadas pelos juízes Brasil afora para descaracterizar situações em análise como não sendo indenizáveis através de dano moral.

A conseqüência disso é claramente vista hoje, onde raríssimas situações caracterizam dano moral in re ipsa (presumido); a esmagadora maioria dos casos exige a demonstração do dano, do abalo, do prejuízo.

Por fim, este entendimento atingiu também a supracitada súmula 370, que passa a ter significado quase oposto ao enunciado em seu texto: para configuração de dano moral decorrente de apresentação antecipada de cheque pré-datado, a parte deve demonstrar o prejuízo que suportou.

Foi neste sentido que decidiu o Tribunal de Justiça da Paraíba, através da sua Terceira Câmara Cível, que julgou a Apelação Cível nº 0805324-14.2018.8.15.0001, oriunda da 5ª Vara Cível da Comarca de Campina Grande.

A parte apelante buscava a condenação de um posto de gasolina em danos morais por conta da apresentação de cheque pré-datado quatro dias antes da data combinada, o que teria gerado-lhe transtornos.

O magistrado de 1º Grau não vislumbrou prova de dano moral indenizável, porquanto não teria havido verdadeiro prejuízo: não houve negativação do nome da apelante, por exemplo. Ainda, na segunda apresentação da cártula, desta vez feita após a data fixada, a mesma fora novamente devolvida por ausência de fundos.

Ao julgar o recurso, o respectivo relator sustentou que a sentença de piso deveria ser mantida por seus próprios fundamentos porquanto, uma vez que a parte autora não produzira prova do prejuízo alegadamente suportado, a hipótese seria de mero dissabor ou contrariedade, não justificando a pretendida condenação em danos morais.

Fonte: Síntese.

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